sexta-feira, 23 de abril de 2010

Liniers

Eu até entendo que algumas pessoas não gostem de Liniers.
Mentira.
Eu não entendo não.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

"Tudo bem.
Ele me apertou nos braços e me disse Tudo bem.
Ainda ecoavam os gritos atrás de nós. Ainda guardava na memória o som do meu pai arfando. E meu nome que ele repetiu quando decidiu, me pegou e saltou. Ele me segurou firme e com carinho, enquanto caíamos no abismo. Mas o que eu consegui ouvir foi ele me dizendo Tudo bem. A última coisa que ouvi antes de morrer.
Tudo bem."

terça-feira, 20 de abril de 2010

"Então uma estrela caiu do céu. E com tal força e fúria que o som repercutiu por muitos dias, o impacto provocou uma energia tamanha, que o deslocamento de ar gerou um impulso que deu 4 voltas no planeta, com duração suficiente para destruir florestas, surgir ondas imensas e derrubar montanhas inteiras. Não houve luz. Mas o poeira e fuligem erguidas se espalharam ao redor do globo, com tal intensidade que o Sol pareceu ser coberto, criando o inverno mais terrível, a noite mais longa. Parecia um castigo. A estrela derrubada devastou tudo o que havia sido criado até então. E seu nome era Lúcifer."

segunda-feira, 19 de abril de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde, bem, nada de mais na verdade-


Havia o sol lá fora.
Havia uma geladeira aqui dentro.
Havia uma tv
Haviam livros, hq’s e dois ou três cd’s.
Haviam rascunhos, arte-finais e algumas idéias geniais.
Havia um cachorro reclamando atenção.
Havia uma maçã começando a apodrecer no meu campo de visão.
Haviam pessoas que me ligavam
Joguei tudo fora.
Não havia nada que eu queria.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

"Eu juro que não queria parecer ser assim, irritado. Eu não queria fechar a cara e parecer um buldogue velho. Não queria olha para os outros de lado, ou de baixo para cima, ou qualquer ângulo que expresse escárnio, sarcasmos, tédio ou desprezo. Mesmo. Realmente não queria que minhas expressões, meus gestos e minha postura demonstrassem esses sentimentos negativos. Mas é que eu tenho um problema crônico de coceira. Por isso torço o nariz, abro a boca meio torto e cutuco a bochecha, esfrego as mãos na testa e evito que as pessoas me olhem de frente. É só por isso. Não tem nada a ver com seu gosto duvidoso para roupas, essa trilha sonora que você me obriga no escritório, nem com esse seu defeito físico que você chama de rosto. Não é nada pessoal. Sério."

quinta-feira, 15 de abril de 2010

"Primeiro eu pensava que era sonâmbulo. Acordava e via geladeira aberta, danoninho em cima da mesa, via marca de pé na parede, na tampa da privada. Não é que eu estranhei a situação, na verdade, eu olhava aquilo e sorria. Pensava que eu devia me divertir muito de noite. Curioso que isso me fazia bem até. Imaginava que mesmo com essa vida de merda que levo, meu corpo ainda sabia se divertir e exigia isso! Nem que fosse para fazer isso sozinho. Sem mim. É um pensamento engraçado, vai. Daí outro dia eu percebi uma coisa que me deixou preocupado. Algo no meu braço. Percebi no ônibus. Na verdade, eu já estava me coçando desde manhã, mas foi no ônibus que percebi que estava me coçando, deu para entender? Eu puxei a manga da camisa e vi uma camada, uma listra meio plástica, opaca, parecendo uma pele seca e dura, e fina. Como se eu estivesse descamando. Eu sabia que conhecia aquilo, mas não me lembrava. Foi então que em segundos todas as doidices que eu via de manhã, toda a bagunça que eu fazia quando durmia, me passou na cabeça de uma vez. E eu entendi tudo. Eu não era sonâmbulo. Eu tinha uma dupla personalidade. Em algum momento da noite, eu acordo como outra pessoa. E essa pessoa é um moleque. Um moleque sujo, porco e ranhento. Ranhento sim. Porque eu me lembrei o que era aquela sujeira no braço. Era catarro. Ranho. Moleque que limpa ranho no braço, que depois endurece e fica aquela merda. Merda. Agora eu tinha um maloqueiro dentro de minha casa. E eu não podia fazer nada."

quarta-feira, 14 de abril de 2010

"Rancor. Esse é o nome que se dá a essa ruga entre meus olhos, a esse dente aparecendo quando torço o lábio, a esse brilho nos olhos, a essa respiração que carrega uma palavra que você não entende.
Rancor. É a cor da minha pele, o recheio do eu estômago, o sabor da minha saliva.
Rancor. Meu substantivo. Meu adjetivo. Meu pronome.
Rancor. É o sentimento e o sentido que vai embalar teu sono.
Rancor. É minha imagem.
Rancor. A última coisa que você vai ver em vida."

terça-feira, 13 de abril de 2010

"Essa é a última noite. É a última, a última antes do fim do mundo. Essas ações serão as ultimas ações, as ultimas memórias, as ultimas tudo. O mundo vai acabar amanhã? Para mim sim. E agora, que o sol nasceu? O dia só nasce quando acordo. Então se você não dormir, o mundo não acaba? Sou ansiosa. Onde você vai, sai da janela. Já, já. Não,é sério, pára com isso, vamos conversar. Não. Não quero que a última coisa que fiz no mundo seja conversar. Gostei de ter ficado a noite com você. Se você pular, acho que meu mundo acaba. Eu já te falei isso, eu não minto. O mundo vai acabar amanhã. E eu? A última coisa que você vai ver vai ser minha bunda ao vento. Ei, isso não tem nada de romântico para você? Tchau. Adeus."

terça-feira, 6 de abril de 2010

Julia – Como assim, “nunca mais”? Não ver Romeu nunca mais... impossível. Isso é a pior sensação que existe: a de inutilidade perante o inexorável. A de sentir um nada diante do destino. Um marionete sem fios, jogado a esquerda. Um joguete. Ai, meu coração. Meu coração, porque não acredito mais em Deus. (entra Romeu pela janela) Só acredito no meu amor. Só acredito no que vejo, toco, sinto e percebo. Só tenho fé em mim. E por nós eu fico de joelhos e faço uma prece. E é só ao meu que me rendo, me entrego.
Romeu – Julia...
Julia – Shhh. Não diga nada. Este quarto é minha catedral, onde encontro com o divino. Onde meu deus, meu Amor, derrama sobre mim suas graças. Onde me avassala. Onde me entrego em sacrifício e onde meu corpo vira carne e meu sangue vira vinho. Meu corpo todo é um cálice repleto do mais puro amor. O amor-deus e nosso ato mortal. Nosso ritual. Nossa missa santa cravada em nossos corpos. Meu corpo é teu. Teu corpo é meu. E na nossa liturgia não há como separar você de mim. Vem! Vamos viver em comunhão, mesmo que para isso tenhamos que morrer aos poucos.