quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

"Onde eu for eu vou com meu Senhor!
Isso escrito naquela camiseta velha chamou mais sua atenção que o nariz escorrendo e o som alto da respiração aflita. Não sabia o porquê, e talvez nem pensasse nisso, mas nem a temperatura que caía rapidamente, os olhos vesgos, o sangue e as escoriações, nem o cheiro de ruim que vinha de algum lugar do descampado pertubavam mais que aquela camiseta e uma possível memória que viria junto.
- Então vai para o inferno!
Deu dois tiros e tirou de sua cabeça aquele incômodo."

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

OS DESENGRAÇADOS


Extremamente atrasado, mas não menos importante!

Ontem foi a estréia dos meus alunos.

Apresentamos 03 cenas:

1) Texto meu; direção deles.
2) Texto meu; direção de um deles (Paulo)
3) Texto, direção, argumento, luz e sonoplastia deles.


Foi muito divertido.

Sinto imenso prazer em trabalhar com essa molecada!

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

PAULICÈIA CITY

-Onde TuH és divina e graciosa-


Sorria como um verso de Noel
Andava sob uma partitura do Pixinguinha
Londres ainda soava em seus ouvidos
E seu riso refletia o dia.

Os machucados eram mais troféus que cicatrizes
Suas palavras de amor estavam declaradamente tatuadas
E seu piercing era um gracejo

Tinha esperança, uma passagem comprada e uma mala rodada
Tinha um sonho, uma paixão, e uma história para contar

Levou embora uma promessa, um livro e metade de um abraço
que ficou de devolver o mais breve possível.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

"Ele deu um tapa no ar. Fez um movimento brusco e curvilíneo para apagar a última das velas. Nunca assoprava. Nada. Sua mão proporcionou uma pequena lufada de vento, forte o suficiente para trepidar a chama e apagá-la. Tão acostumado, fez o movimento subindo os degraus, olhando em outra direção. A chama se apagou logo, e dela saiu uma fagulha de um vermelho tão vivo e intenso que brilhava mais que o esperado. Essa fagulha rodou pelo ambiente e se refletiu nos olhos da menina. Foi um segundo, ou talvez menos. Mas nesse pequeno instante, seus olhos pareciam vivos de novo. Daria a impressão de quem a menina quanto a fagulha viviam e morriam juntas, e não que ela já estivesse morta há alguns minutos. E logo depois desse segundo, ou menos, a escuridão total. Ele teria achado poético, se tivesse prestado atenção."

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

PAULICÉIA CITY

-uma brisa ausente-


Mais distante do que imaginava
Depois de ônibus, metrô e trem
Sentado sob o sol ardente
Olhando florzinhas quietas
Sorria
Docemente enganado.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Teatro em LIBRAS


Tenho muito o que dizer sobre isso. SObre o grupo, sobre as idéias, sobre os planos...

MAs hoje, só direi que se eu fosse você, eu iria.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

“Raul Seixas me dizia que para aprender o segredo da vida bastava observar o choro das pedras. Que, percebendo o lamento imóvel do calcário, se compreenderia que certas coisas não valem certos esforços. Como se os seres mais antigos do planeta, tivesse aprendido que, ás vezes, só nos resta constatar - o choro em si é opcional.
Que a felicidade não é algo que está em suas mãos. Não é algo que depende de você.
Que até o suicídio é uma espécie de lamento.
Que os momentos felizes não valem seu peso em lágrimas se colocarmos na balança todo o desprezo, rancor, humilhação e tudo o mais que a vida lhe cobra por um carinho a mais.
O Raul me falou que o segredo da vida é que vai dar merda.
Mas isso já não era segredo algum.”

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Cê tá sumido... qui é qui cê tem feito?

Tenho trabalhado pra porra!




Todos aqui sabem que admiro o Mario Bortolotto. Mesmo quando eu me afastei de São Paulo, de ir a festas e peças, eu acompanhava seus escritos e assim, sabia o que ele fazia. Quando eu não consegui entrar na estréia do “O que restou do sagrado”, percebi que realmente o tempo do teatrinho – os amigos vão entender – tinha acabado. E a vida foi me levando, levando... O Mario foi a primeira pessoa que me abriu os olhos para o tempo desperdiçado, e assim, para o desrespeito com o próprio trabalho. Foi para ele que fiz a primeira homenagem em cena (Tem que ter culhão! – 1), quando ele foi alvejado, não pude ir para o hospital, porque ia dar vexame. Tenho um lado histérico que o bom senso me ajuda a não mostrar. Mas enfim, o que eu quero dizer com isso? Que novamente, pensando no Mario, decidi mostrar aqui o que tenho feito que me tem impedido de criar um texto novo por dia – bons tempos, hã! – E assim, manter sempre atualizado. Na verdade, eu não precisava falar nada disso... Mas eu tenho orgulho dos meus amigos. Gosto de falar deles. Gostaria que as pessoas conhecessem algumas pessoas que conheço, e assim o mundo se tornar um lugar melhor. Pelo menos para mim.

O que tenho feito:

• Estreei 05 peças esse ano. Uma no Rio de Janeiro. Todos textos meus.
• Criei e dirijo um grupo de teatro em LIBRAS.
• Estou dando aula para uma das melhores turmas que já tive, lá em Diadema.
• Estou dirigindo um grupo de Butoh.
• Dirijo duas atrizes no Rio de Janeiro.
• Lancei meu primeiro livro.
• Ganhei alguns prêmios e alguns editais – não recebi nada ainda.
• Ando engordando feito um peru – é que o natal taí, sabe...
• Assisti mais e 100 filmes.
• Li mais de 50 livros.
• Não vi nem 10 peças.
• Tenho estudado japonês sozinho – é horrível, se alguém quiser ajudar, agradeço.
• Tenho feito um curso da USP sobre a Questão de Gênero no Japão – da Era Meiji até a atual. Muito bom, mas tenho que fazer uma monografia...

E o ano não acabou, e ainda não fiz tudo o que queria.

Mas para começo de conversa, é isso.


Estou em cartaz com “Conheci uma pessoa”,a última peça da Trilogia Lésbica.

Meu elenco é muito bom. Tenho uma sonoplasta que pegou no susto e está mandando muito bem. E as pessoas têm gostado.

Abaixo, o que a Priscila Jerônimo – atriz e dramaturga, escreveu no seu blog:


"
Hoje, fui ao teatro ver: " Conheci uma pessoa" texto e direção: Ronaldo Ventura.


Já havia assistido a outra peça do Ronaldo Ventura ( Eu queria ser a Cássia Eller ),que faz parte do Trilogia Lésbica e confesso que gostei imensamente da leveza do texto, da beleza da trilha sonora e da inquietante curiosidade que a peça despertou em mim, não de viver algo (gls), não é isso, mas a curiosa vontade de ver como a história continua, ou seja dá vontade de ler o livro, de saber mais desses personagens... A beleza da peça está exatamente em não erguer uma bandeira gls, mas de mostrar que os sentimentos, as inquietudes, o romance, a paixão, é desperta em seres humanos,em pessoas, independente de gênero. É uma história de duas mulheres que se compreendem, se tornam amigas e por consequencia se envolvem emocionalmente,mostrando que o amor, a essência do sentimento independe de sexo (gênero)e como é belo de se ver...
E como disse a ele ( Ronaldo), todos os textos que leio e a segunda peça que assisto, me remetem a 3 fatores essenciais e presentes em sua obra: gosto (sabor), som e cor. Parabéns Ronaldo, pelo bom gosto e pela singeleza de falar de algo tão peculiar quanto o amor, a amizade e o carinho entre pesssoas do mesmo sexo. Eu recomendo."



Agora xô i lá, que tenho que ir para Diadema, pegar uma carona até a USP, se der, na volta passo na Cinemateca para ver outro filme.

Se eu fosse você, semana que vem eu iria assistir a peça.

Tentei colocar a imagem e não consegui.

Há Braços

terça-feira, 9 de novembro de 2010

"Mais intimo que dividir a cama, é dividir o espelho do banheiro"

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

"A gente sai do bar, e a neve começa a cair, de forma tão lenta e quieta, que eu só percebo quando para o cabelo dele, já desarrumado pelas risadas e álcool, e vejo os pontos brancos. Penso, no momento totalmente indevido,mas devido as risadas e álcool e vontades, que o branco da neve é diferente do que eu esperava, pensava que fosse. Achava que refletisse mais as luzes do entorno. Uma cai perto de sua boca e eu me seguro a tentação de pega-la com a língua de uma maneira totalmente, e inesperadamente sã, que até me surpreende. Ele olha minha cara e ri. De novo. E mais. E eu rio junto. E ficamos assim. Cúmplices de desejos íntimos secretos que talvez nunca sejam ditos e concluídos, compartilhando frio, neve e graça."

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

"Tomar isto por aquilo. Como se fosse. Uma forma de compensação, de quase frustração, de ter algo no lugar de outro. Satisfazer o desejo com o que dá e não com o que quer. É assim que brinco de amar. Usar o que está a mão por falta daquilo que se mantém longe. Por isso choro por dentro, e rio com os olhos. Por isso gaguejo e digito e-mails errados. Por isto ou aquilo. Não importa. Me acostumo nessa condição, que não mudo. Vivo uma vida por outra e serei algo qualquer em vez do que sempre quis."

terça-feira, 5 de outubro de 2010

"Ela me colocou em cima da mesa, me abriu as pernas e me olhou nos olhos poucos segundos antes de olhar para meu vestido. Consegui apoio nas cadeiras e respirava forte. Ela sumiu pelo tecido e senti sua pele nas minhas coxas, seu nariz roçando minha calcinha e uma língua molhada e quente logo abaixo do umbigo. Lembrei da minha mãe, sabia qe não era hora para isso, mas era mais forte a lembrança dela me vendo comprar esse vestido e falando que mulher quando quer está sempre pronta. Meu Deus eu quero. Eu quero ela. Ela apertava minhas coxas enquanto me mordiscava por cima do algodão. Eu ri da minha mãe, se fosse verdade não viria com uma calcinha velha dessas. Ela aparece debaixo da tenda entre minhas pernas: você está rindo? É que está gostoso. Ela não desce mais, fica ali me olhando e brincando com seus dedos em mim. Tenho vergonha e fechos os olhos, para ficar mais longe ainda, jogo a cabeça para trás. É um clichê de sexo, mas tudo bem. Ela sabe disso e tudo bem. Estamos transando na cozinha dela e tudo bem. Estou feliz e está tudo bem. Não pára, vem! Ela se afasta um pouco e olho com cobiça. Gosto do teu cheiro. Pára de falar, isso me deixa com vergonha e não precisa se dito, só me faz. Ela vai até ali e volta rápido com um plástico na mão, um papel-filme. Me assusta. Só tenho isso, desculpe. E vai colocando em mim. Opa! O que é isso? É que eu vou te chupar. Agora! Não precisa falar essas coisas, é só fazer. Eu vou colocar isso em você, porque eu não te conheço, sou sapata mas não sou burra, não sei com quem você anda. Como assim? O quefoi? Qual o problema? Se eu fosse um homem você não ia pedir para pôr camisinha? Fico quieta e extremamente constrangida. Não? Esse é mais um motivo para eu fazer isso. Finalmente broxo, fecho as pernas e sento de qualquer forma. Preciso ir. Ei, você devia se sentir feliz por estar com alguém que te preserva. Sei, sei, cadê a chave? Vai embora da minha casa, hipócrita do caralho. Eu só nunca fiz isso. E vai viver assim na ignorância? Olha, depois eu te ligo, ta? Preciso acertar isso na minha cabeça. Não, não liga não. Não precisa. Tchau. Tá. Merda! Droga!"

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

PAULICÉIA CITY

-uma paráfrase-


Querendo ser aquela frase do Hemingway
viver aquele verso do Bukowski
sacar o que Leminski disse, no meio da avenida.
Ser maior que a citação do Nelson
e entender Murakami.
Sofrer embaixo de chuva com Caio f.
e rir mirisolicamente do mundo diante dos olhos.
Não conseguindo ser nada além de um trecho de Lobão.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

"Por favor. Eu tô pedindo por favor, desligue esse rádio e me ouça. Pare de não ouvir nada e me ouça. Não batuque no volante, não pararareia nada. Pararareia. Não sabe o que é pararaeia? É ficar cantando pararara porque não sabe a letra. Você não sabe inglês, porque você tenta? Ô! Me ouça, meu escuta, presta atenção! Vou desligar o rádio e te deixar no silêncio até ver o quanto você agüenta.






Não. Não era nada importa. Deixa pra lá."

terça-feira, 28 de setembro de 2010

"Era uma gaja delícia. Poderia ter Armanis, Diors, Dolces & Gabbanas a vontade – talvez até tivesse, aparentava assim, só a vi com um sapato de salto, o esquerdo, e não sei reconhecer um Prada quando vejo, admito, mas enfim – ela poderia ter qualquer coisa. Ou até não ter. Ela poderia não ter a voz que eu imaginava, poderia não ter comida em casa, por isso tão esbelta, poderia até não ter o gosto para mulheres como eu. Como eu. Mas algo que ainda bem que ela não tinha era uma persiana boa, adorava a ver passeando sob a luz do sol, sob qualquer pretexto. Agradecia a qualquer deus que estivesse a mão no momento, o fato dela ter um gosto divertido para roupas íntimas e a vontade desleixada de deixá-las de lado, todo dia. Toda tarde."

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

PAULICÉIA CITY

-um redemoinho-


Ela deitou sua cabeça entre meu ombro
e meu pescoço
De forma que eu conseguia ver um pequeno espaço em branco
rodeado pelos seus cabelos escuros.
O cheiro dela me invadia a cada respiração.
O som suave de sua respiração embalava o que me parecia
um sono justo.
O peso leve do seu corpo servia de âncora
para que eu percebesse que a realidade
podia ser um lugar legal de se estar.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

"Um barulho. Um susto que chega antes de qualquer cheiro ou grito. Os tamancos, sapatos e todos os saltos possíveis se atropelam entre os gritos e pequenos murmúrios de reza.
- Onde está o telefone? Cadê o telefone?
As pessoas só lembravam dele em momentos assim. Telefone era um menino pouco maior que Cego Dalton, só que era quieto. E preto. Outra diferença é que ele só conseguia se lembrar de poucas coisas, mas nunca se perdia, e quando sozinho era extremamente rápido. Cego Dalton também era rápido o suficiente, mas era preguiçoso.
- Meu Deus! Telefone!
Telefone andava meio triste. Fazia favor para as pessoas e vivia daquilo que cego Dalton não queria. Mas não se importava, estava por perto e gostava de ajudar. Dentro da sua pobreza de complexidades, percebeu que gostava mais de dar recados de amor. Gostava mais de dizer as palavras apaixonadas para as pessoas e assim sorria mais. Mas as pessoas só se lembravam dele quando alguém morria.
- Telefone! Cadê você, moleque desgraçado!
Ou em tiroteio, ou em vingança de mulher, ou trapaça no jogo, enfim, em desgraças. Telefone estava cansado de ouvir e repetir desgraças. Decidiu procurar algum lugar onde as pessoas precisavam ainda dizer as outras palavras de amor.
- Da próxima vez a gente prende esse menino! Cadê o Cego Dalton?
Telefone sabia, de tanto ouvir, aprendeu, que não seria em Lucíola que ele seria feliz."

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

"Eu olho para você e me dá raiva daquele homem que comeu os melhores anos de sua vida. Não foi apenas você e a comida da sua mãe, que ele comeu ao longo dos anos. Mas justamente isto. Os anos. Os dias. As horas. Que vieram uma a uma, uma sobre a outra, encavalando assim, os momentos e os espaços que não cabiam eu, nem meu carinho. Carinho, que não é amor, nem desejo, nem frescura. Só uma vontade de cuidar. Como daquelas que temos ao ver um filhotinho de qualquer bicho. Era esse lado bicho seu: que morde para fazer carinho, que se aninha e dorme apesar do barulho, que se incomoda com fogos de artifício, que reconhece o falso pelo cheiro, que faz barulho mesmo e foda-se. Queria ver você bicho, livre. E como bicho, você se prendeu, se deu a quem o afago lhe caiu bem. E não se arrepende de nada. Confiro o brilho dos seus olhos, e vejo que você está feliz assim. Queria estar feliz por você. Mas não confio em suas decisões. Nem nos seus gostos pessoais."

terça-feira, 14 de setembro de 2010

"Ela veio com seu vestido e uma travessa com duas xícaras e um bule de chá. Algo que só tinha visto em filme: uma travessa com xícaras e um vestido com aquele corte e decote que parece segurar tão bem os seios. É um vestido que antes me daria inveja devido aos tamanhos dos meus seios. Sim, tamanhos. Eles são meios desproporcionais. Uma vez eu disse isso para ela, que sorriu o riso perfeito e respondeu que estava enganada, que era uma impressão errada, e que me faria mudar de idéia. Sobre os seios? Sobre tudo. O sorriso não me oferece nenhuma xícara, me apresenta as possibilidades de escolha e espera uma atitude minha. Acho. Desvio o olhar no momento que percebo que eu realmente não sinto inveja, sinto desejo. Não acho. Não acho mais nada, me atrapalho entre xícaras e bule, e o riso aumenta o volume e descubro que se pode ser charmosa e vulgar ao mesmo tempo quando escuto para tomar cuidado. Não vá queimar nem os dedos nem a língua. No meio da atmosfera de Melissa e Laranjeira, o calor sobe em forma de vapor e suor. E assim ela me acha. E eu me encontro. Numa neblina pouco espessa de início de sábado."

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde as pessoas telefonam mas ninguém liga-


Esqueci do ônibus
Atrasei minha aula
Perdi o emprego
e mais cinco horas de vida
ouvindo um lamento choroso
no telefone.
Não consegui ter nada de volta
Nem o trabalho, nem o respeito, nem as horas
e nem ela.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

"Depois da ultima explosão, partículas de quartzo se uniram em nuvens por sobre toda a cidade. A pressão atmosférica criou colchões de ar quente, bolsões de ar frio, nuvens de quartzo e acumulo de água em suspensão. Por vezes, tudo se choca e acontece a chuva dura, gotas tão pesadas que quebram telhas, vidros e ossos. Pedras que caem flexíveis e letais. Agora é uma dessas vezes, o quartzo presente em grande quantidade, reflete a luz do sol que acaba de nascer. A cidade se ilumina em milhares de pontinhos luminosos que caem, parecem diminutas estrelas cadentes. As gotas brilham e cegam por um instante o visitante despreparado. Levanto a arma e atiro antes de chova em cima de mim. Ouço a bala ir quebrando as gotas, fazem som de cristais. Uma sinfonia em luz ao amanhecer, é a última memória que ele vai ter na vida."

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

- eu te amo, espanhola.
- Além dessa frase não ser sua, ninguém pode ser uma espanhola sem maquiagem.

terça-feira, 31 de agosto de 2010

"A pior coisa que havia nela, era ela saber que era bonita. Era desconfortável olhar para ela. Chegava a incomodar. Quando sentou diante de mim, num banco de pedra, no meio de uma praça, em plena Avenida Paulista, e me olhou. Simplesmente fiz o maior papel de palhaça. Eu olhava para ela e gaguejava, e quando tive coragem, só pude dizer o óbvio: Você é linda. Ela sorriu, abaixou os olhos e fez todo o charme que eu já conhecia. Quase cuspi dizendo que não, você é linda de verdade. Eu me lembro da boca secando enquanto eu falava bobagem após bobagem: Você é realmente a mulher mais linda do mundo. Ela levantou os olhos com uma calma e o brilho deles era a luz que eu seguiria por toda a minha vida. Ela abriu a boca pintada de batom suave e falou algo como E o quê mais? Eu não entendi. Como o quê mais? Não existe nada mais depois de você. Foi o que quis dizer. Mas não disse. Fiquei ali, gaguejando, tremendo e querendo me jogar debaixo de um ônibus. Você é fofa, me disse antes de marcar de vermelho claro minha bochecha. E saiu levando seu sorriso e toda minha estima. Eu era uma mulher marcada, vazia e que não sabia se tinha fracassado ou não. Fiquei sentada naquele banco até ligarem o chafariz. Queria que algo chorasse por mim."

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde Jaci comeu Peri antes de Ceci-


Tinha as costas fortes
os olhos apertados
dores nos braços
melodia na voz
pernas perfeitas
Tinha um riso secreto
Um medo no peito
Punhos fechados
para qualquer efeito
Tinha a certeza de que não ficaria comigo para sempre
e a determinação de nunca estar errada.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

um rascunho para Fátima Mesquita

Ela abriu a cortina e a minha vontade de chorar foi maior. Mas havia algo de puro no seu sorriso, que me trouxe para perto, como para sofrer, como se fosse uma oferenda.


- Um céu de brigadeiro!
- Porque? Ele está marrom?
- Como assim? É brigadeiro porque ele está limpo, limpo, limpo. Azul lindo.
- O único brigadeiro que conheço é aquela bolinha de chocolate.
- Não boba, brigadeiro também é coisa de exercito, que nem sargento, essas coisas.
- E o que tem a ver?
- Não sei, mas você acha que ia existir uma bolinha de chocolate chamada Luiz Antônio?
- Ela podia ser casada com a bolinha de chocolate Faria Lima.
- Farinha Lima.
- Argh, uma farinha com gosto de lima.
- Melhor que um chocolate com sabor de Luiz Antonio.
- Será que eles são o bem-casado?
- E a Maria-Mole e a Carolina, elas tem um caso?
- Qual delas tem pé-de-moleque?
- Eu queria um Sonho.
- Eu te dou um sonho se você me der um beijinho!

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

PAULICÉIA CITY

-aquele lugar entre o céu e a terra onde ninguém sonha-


Desliguei o telefone disfarçando o sentimento
Cumprimentei e beijei negando qualquer tristeza
Tirei nossas roupas fingindo desejo
Fechei os olhos tentando não chorar
Dormi sabendo que não seria feliz
nunca mais.
- Você parece um mousse de chocolate.
Eu achei um elogio. Aquela menina me chamando de mousse, e negão que é negão não tem frescura com chocolate. Pô, chocolate é gostoso e derrete na boca. Eu gosto de parecer assim. Eu nem falei para ela que não é “um” mousse, mas uma, não que eu fosse fêmea, mas que mousse é uma comida feminina. Mas tudo bem, magrelinha e branquinha, não tem como saber de tudo. E daí? Eu só queria levar uma mordida. Eu sorrio meu sorriso branco e puro e agradeço. Uns dois segundos depois ela fecha a cara e parece que vai vomitar, já vi ela fazendo isso antes. Acho que a idéia de comer algo não lhe caiu bem. Não cabe muita coisa no seu estômago, acho que nem a idéia de se satisfazer.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

"Uma bandeira americana do tamanho padrão para prédios demora em torno de 8,75 minutos para queimar totalmente. Mas a bandeira americana fabricada na China demora 6, 37 minutos e não queima totalmente, alguns pedaços se soltam no meio e voam chamuscados até onde o vento os leva. E ainda ficam rebarbas brancas, ou vermelhas, ou azuis em tons tostados. 6 minutos e 37 segundos. Foi o tempo necessário para você notar que eu te amava. O incêndio tinha começa no andar debaixo, perto do refeitório, acho. Ouvi um barulho e olhei para fora no instante exato que o fogo tocou na bandeira do lado de fora. Não havia mais ninguém na sala, nem no corredor. Havia uma espécie de paz ao redor. Havia medo nos seus olhos e um revolver na minha mão. Eu tentei dizer algo, mas sempre gaguejava perto de você, então evitei. A fumaça se fez notada, e o chão começou mesmo a ficar quente. Isso até era engraçado. Achei engraçado no momento e te assustei mais com meu quase riso. Tentei colocar todo meu sentimento por você no meu olhar. E acho que você entendeu tudo quando atirei. Você estava quente, e o chão ainda não incomodava quando beijei sua boca. Engoli um pouco do teu sangue e não tive nojo. Aceitaria qualquer coisa de você. Até o desprezo se você me notasse um dia. Se tivesse me notado um dia. Eu te beijo mais e espero vir as chamas, enquanto ao nosso redor, planam suavemente pequenos tecidos chineses coloridos solitários."

terça-feira, 10 de agosto de 2010

"- Por favor, não venha. Porque se eu te ver, eu não vou resistir. Vou querer te beijar, vou querer ficar presa nos seus braços, vou querer agarrar seus cabelos e me perder. Eu não posso me apaixonar por você. Eu não devo. Não é certo. Você é linda e é perfeita. Perfeita! Mas... Eu não saberia como viver com isso. Não saberia como te apresentar para meus amigos, para meus pais. Meus pais. Seria exigir muito deles. Eles já me deram tanto e tiveram tanta paciência comigo. Me deram tanto amor. Não posso recompensá-los com uma decepção. Não é justo. Você entende?
- Não.
- Foi lindo o que se passou entre a gente. Foi mágico. E eu não esperava encontrar alguém como você. Eu não quero te ver porque se você vier aqui, não vou querer que você vá embora.
- Você está escutando o que você mesma está dizendo?
- Sim. Não. Mais ou menos.
- Eu sei o quanto deve ser difícil gostar de alguém como eu...
- Não. Não é.
- É sim. Eu sei. O mundo me mostra isso todos os dias.
- Ei, eu sei como é ser olhada de lado.
- E com repugnância?
- ...
- Seus pais te amam. Eu não tive essa sorte. Mas eu não quero falar disso. Quero falar que é... uma sorte. Eu ter me apaixonado por você. Apesar de você ser... mulher. Porque...
- Eu queria que fosse também. Apesar de você... parecer mulher.
- Sei que não devia perguntar isso, mas qual o problema?
- Eu não posso me apaixonar por ninguém que tenha um pênis! É isso!
- Mas eu escondo ele na maior parte do tempo. E só uso para trabalhar.
- Isso não vai dar certo. Vamos parar por aqui.
- Você quer que eu opere?
- O quê?
- Se eu me tornar mulher. Inteira. Completa. Você ficaria comigo?
- Não tem resposta certa para isso, não é?
- Não. Não tem.
- Você entende?
- Não muito. Na verdade, não entendo não. Eu só sinto. Tchau.
- Eu acho que te amo.
- Não. Eu te amo. Tchau.
- Tchau."

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

PAULICÉIA CITY

-uma pergunta inútil-


Como algo tão simples
como uma música
uma fala de um filme
uma foto no out-door
uma fruta, um raio de sol
uma data grifada e m vermelho no calendário
Consegue gerar algo tão complexo
quanto a certeza de um amor que resiste?

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

"Me visto de lua e espero você. Abro espaço para vento. Pernas, braços, dedos. Vejo vaga-lumes e sei que não. Vejo Boi-tatá e sei que não. Vejo luz em cabeça de mula e sei que não. Sinto sereno e acho que talvez e espero. Esperença. Esperança é fé. Esperença é certeza. Calmo. Esquecendo do frio, do vento, do medo, da fome. Do humano no corpo de terra. Se Deus quisesse que fossemos mais teria usado material melhor. Simples e claro. Claro em redor de mim. Fecho os olhos e vejo luz. Começou."

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

"Correr. Basta correr. Basta queimar o oxigênio e transformar tudo isso em movimento. Energia. Basta permitir que o ar entre, que os pulmões se enchem e que o sangue corra. Eu corro e o sangue corre. Quase não encostar no chão e o coração batendo em todas as extremidades possíveis. Basta correr para não pensar. É um entre. Entre fugir e ir. Entre querer e agir. Entre voar e ficar parado. Suor é água quente que refresca. O choque do ar parado com meu corpo em movimento provoca vento. Crio vácuo e preencho espaço. Correr é estar entre o possível e o impensável. É aumentar as variáveis entre tempo e espaço. Ou diminuir. Não sei. Gastar a pele, gastar o chão. Se está usado é porque é útil. Correr do finito. Correr do prosaico. Correr dos verbos de ligação ruins. Correr em busca. Correr por algo. Correr devido ao ininterrupto medo de estar no lugar errado."

terça-feira, 3 de agosto de 2010

- O que você acha?
Eu acho que vou te prender aqui nesse quarto, para que você não saia nunca, porque você é tão linda, e eu te quero só para mim.
- Eu acho que o outro é melhor.
- O verde? Por que?
Porque ele tem um decote perfeito, porque ele demonstra sua beleza e delicadeza, porque ele me lembra o exato momento que me apaixonei por você, naquele shopping idiota, quanto te vi chorando.
- Porque ele realça os seus olhos.
- Mas daí com que sapato que eu vou?
Sapato? Mas que sapato? Seu pé é perfeito demais para ser coberto por qualquer pano, couro ou plástico. Seu pé. Seu pé estava machucado, mas não era por isso que você estava chorando. Não era por isso que você sentou naquele banco em frente a loja de vestido, e olhava para frente e não me via.
- O preto.
- Mas não é melhor eu de salto?
Eu estava de salto, e você não me via. Eu estava de tênis todos os dias na escola e você não via. Eu estava parada, na frente da vitrine da loja, esperando qualquer cliente, eu não esperava te ver, não esperava me apaixonar por você até te ver mancando, chorando, indo até a vitrine e olhar de maneira delicada para esse vestido que está na sua mão esquerda. O vestido que eu paguei metade só para você levar, e você nunca soube.
- Não se você quiser dançar.
- Sabe o que eu queria?
Eu queria te ver com este vestido, eu queria te ver feliz, eu queria te ter para mim. Eu queria te beijar. Queria te amar feito louca que eu era. Queria ser mais uma conhecida da escola. Não queria se sua amiga, não sei como chegamos nisso. Queria poder te dizer o que eu sinto. Queria que você não fosse embora quando eu dissesse isso.
- Comer feito uma esganada.
- Como é que você me conhece tão bem?
Porque eu te amo, porra!
- Sei lá.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde as palavras insistem-


Não era necessário ter dito tudo aquilo.
O olhar de desprezo
o gesto de descaso
e o silêncio
já diziam tudo o que eu precisava saber.
Já deixavam claro que minha vida ia terminar
De novo.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Pro Ana

"Eram todos medonhos. Com seus dedos amarelos, cobertos de farelo salgado, com suas bocas meladas de iogurte cor-de-rosa, roupas sujas de chocolate. Eram nojentos de se ver. O cheiro era insuportável. Saí do pátio da escola correndo de volta para a sala. O bom de correr é que a gente perde mais peso. Tentei acalmar a respiração até encontrar uma pílula. Por sorte encontrei a pílula primeiro. Difícil. Não sabia que engolir era algo que se esquecia ao perder a prática. Sinto um certo orgulho. Sinto o comprimido escorrer para dentro de mim, e evito o nojo. Sinto um calor que não é agradável, mas não interessa. Sinto um sorriso aparecendo. E espero sem sentir a hora passar. O sinal assusta. Eles voltam para a sala, sentam em volta de mim, balançam suas peles gordurosas e abrem suas bocas que cospem açúcar. Eu sorrio de volta. Vou sobreviver, apesar de vocês."

quarta-feira, 28 de julho de 2010

"O que havia era uma ausência tensa, uma tristeza densa, uma saudade imensa.
O que havia era um cômodo vazio, uma porta fechada, e pegadas sem volta.
O que havia eram espaços entre os sapatos, cereais sobrando, e uma toalha limpa em qualquer canto.
O que havia eram luzes não acesas, papéis não lidos, telefonemas não atendidos.
O que havia era um grande vácuo.
O que havia era um buraco negro
O que havia era um nome e sobrenome que quanto mais eram repetidos menos sentido faziam.
O que havia era o nulo, o obsoleto, o fútil.
O que havia era meu corpo desejando o seu, num lamento inútil."

terça-feira, 27 de julho de 2010

"Nem abriu os olhos. Tateou com a ponta dos dedos a umidade e pela viscosidade teve certeza que era sangue. Levou ao nariz. Um cheiro bom e um pouco desagradável. Coisas degradáveis eram boas em sua maioria. Continuou na umidade até encontrar a fonte, seu corpo. Tateando com carinho, foi criando outras umidades. Um pouco de saliva que gostou de engolir. Um pouco de suor que nem percebeu. E um toque delicado e viscoso que levou ao nariz por um segundo só para constatar o cheiro bom e agradável. Menos ferroso. Um cheiro de fruta que não conhecia. Um básico-ácido se fosse possível ela saber o que era isso. Voltou ao tato nos pêlos finos e na fenda úmida. Quanto mais carinho, mais molhado. Esqueceu do sangue e da mudança generalizada que iria ocorrer no dia já pré-programado para não se fazer nada. Quanto mais carinho, mais gostoso. Mordeu o próprio dedo. O outro. E percebeu o suor, quando percebeu a respiração mais alta. Apertou o maxilar e apertou o seu mamilo esquerdo. Seu pequeno e duro mamilo esquerdo. Apertou como apertou Michele. Mordeu o dedo quando lembrou de Michele. Quanto mais forte, mais lembrava de Michele. Tentou fazer como Michele fez com ela. Não era igual. Não era tão bom. Quanto mais rápido, mais alta a respiração, mais duro seus mamilos, mais vontade de Michele. Quanto mais Michele, mais molhado. Levou novamente o dedo ao nariz. O outro, pois o mordido agora estava descansando. Gostava do seu próprio cheiro. Melhor que bom. Mais que agradável. Abriu os olhos e viu sua primeira menstruação estragando o colchão. Se levantou, se preparou para o banho e foi chamar sua mãe. Agora era mulher. Poderia lembrar de Michele quando quisesse."

segunda-feira, 26 de julho de 2010

PAULICÉIA CITY

-fazer o quê?-


Já haviam se passado mais de 8 horas
Ela insistia em falar
e mendigar um pouco de atenção
Eu só queria espirrar em paz

quinta-feira, 22 de julho de 2010

"Há algum tempo tinha parado de ouvir. Parou de ouvir. Simplesmente. E curiosamente começou a escutar os sons de dentro. Com calma conseguia ouvir o sangue nas veias, o inflar dos alvéolos, conseguiu escutar o desmoronamento de camadas de cera que se formavam ao redor os tímpanos. Um dia se assustou acreditando ter escutado a corrente elétrica gerada pelo raspar das pernas no cobertor, não passou disso. Mastigar era um sofrimento, mas salivar era uma delícia de se ouvir. Tentou um dia ouvir os cabelos crescerem, não conseguiu. Chorar era nostálgico, fazia lembrar da infância, de momentos felizes, o som das lágrimas sendo criadas e expelidas fazia-o lembrar de viagens com a família durante as férias.Percebeu, quase sem querer, que ao fechar os olhos, um zumbido grave e baixo, sumia. Ver era sonoro. Surpresa. Ajudou a dormir. Dormindo, sonhou com um beijo. Acordou com o desejo de ouvir um beijo. O sangue correu mais rápido e o calor nas proximidades da pele tinha um som incomodativo. Teve uma ereção. A sensação era gostosa, mas o som do sangue enchendo os vasos cavernosos, a dilatação, a pele esticando, feria seus ouvidos. Tudo isso causou uma crise de ansiedade, que fez seu coração ficar mais alto que já ouvira. Levou as mãos para tampar os ouvidos, orelha, sei lá, e isso não importava, era um gesto inútil, já que o som vinha de dentro. Cada vez mais alto, a ansiedade e o desespero o fez respirar mais rápido. Os chiados dos pulmões, o sangue correndo, o coração batendo, a saliva desaparecendo, a pele secando, o pênis intumescendo, os olhos querendo ver mais do que podia. Seu corpo todo era uma orquestra de dor. Finalmente ouviu a descarga elétrica. Ouviu todos os poros responderem ao estímulo ao mesmo tempo. Ouviu os músculos retesarem e relaxarem. Não conseguiu ouvir a mudança de velocidade do sangue, mas talvez só porque não prestou atenção. Mas ouviu a descarga elétrica e ouviu o coração parar. Morreu. De vontade de um beijo."

segunda-feira, 19 de julho de 2010

"Foi só olhar para baixo que viu a mancha. Ali, na própria camisa. Sem pensar uma vez, passou a mão. A mancha ficou maior. E com outra cor. Além do vermelho original, o que sobressaía era um tom marrom. Olhou para a mão. Limpa. Alisou novamente, quase esfregando. A mancha aumentou, a camisa ficou úmida. Depositou o café que estava na outra mão em cima do balcão, sem notar que estava no meio de um corredor, tirou a parte que estava dentro da calça, afastou a gravata e levantou a camisa. Ainda sem pensar, se assustou com o que não viu. Não havia pele. Nem gordura, nem músculo, nem osso. Havia um coração. Exposto. Que batia compassado com o relógio, embora isso ele não tenha notado. Ainda. Quando finalmente começou a pensar, só conseguiu compor uma pergunta: Porque você é marrom? Sem saber responder, não estava acostumado, se re-compôs. Ajeitou a calça, a gravata e olhou para a mancha que ocupava já uma grande parte do lado esquerdo da camisa. Olhou o café sobre o balcão, e virou o copo sobre si mesmo, encharcando o lado direito, tornando a camisa por igual, suja e molhada. Retornou a sua baia, e sentando quase disse em voz alta: ninguém vai perceber a diferença. Mas não podemos chamar isso pensar, não é?"
"Quando ela percebeu, percebeu tudo. Percebeu as coisas e o mundo. Descobriu como a chamariam, lésbica, mania de adolescente de ar nome para tudo. Logo ela, que nunca gostou de ser chamada de nada, nem pelo nome, às vezes. Percebeu não tinha salas de bate-papo para lésbicas de 13 anos. E ela precisava muito conversar com outra lésbica de 13 anos. Percebeu isto quando foi conversar com alguém da própria classe e não sabia como, quando no jantar perguntaram como foi o dia e não sabia como, quando sentou diante de uma comunidade do Orkut para meninas que gostavam de meninas e não sabia como. Ela se percebeu, quando viu sua logo-logo-ex-amiga, dando o seu primeiro beijo em alguém que não era ela. Sentiu raiva, ciúmes, inveja e sensação desgraçada que não sabia o nome. Perceberam ela por perto, sorriram e disseram oi. Ela só pôde correr. Fugiu. Quando percebeu que tinha lágrimas nos olhos, que estava cansada mas ainda podia correr mais, que não sabia onde estava mas isso não interessava, que era profundamente apaixonada pela melhor amiga, que seria eternamente triste, percebeu tudo."

PAULICÉIA CITY

-um beco escuro-


A joguei na lateral de um caminhão
Bateu a cabeça
gritou
xingou.
Arfava exageradamente.
Sua pele branca brilhava no escuro.
Seu suor ficava preso nos meus pêlos
Seu cheiro ficava rondando minha respiração
cada vez mais seca
e alta.
Quando gozou
deu dois gemidos agudos.
Perturbando ainda mais
a noite parda dos gatos

quarta-feira, 7 de julho de 2010

"Eu que carrego comigo a herança em fotos dos meus pais, que carrego cansado algo para comer, que carrego tudo que posso dentro da minha mochilinha. Minhas perguntas, e minhas certezas, e meu destino, e minhas tristezas, e meu adeus. A chave carrego no bolso por costume, devia jogar fora, mas gosto de passar ela pelas unhas e me manter limpo. Carrego poeira no corpo. Restos de lamas nos tênis. Marcas de grama nos joelhos. Carrego a mágoa na garganta, e a certeza no olhar. Não me viro nem uma vez. Olhar para trás é criar uma esperança. E eu não espero mais nada. Sigo engolindo o mundo empurrando as calçadas para o passado. Ouço um adulto gritando e sei que é comigo. Ignoro e me apresso para qualquer lugar. Meu nome mais alto ou mais perto, não sei. Não penso. Tento correr na direção que imagino que tenha algum ônibus que me leve daqui.E minha gola me aperta quando é puxada. E me viram e me falam e me apertam e me pegam pela mão e me levam de volta. Não sei. Não penso. Só sei que dessa vez não deu certo, mas amanhã eu tento de novo. E levo todas as chaves comigo para não correr o risco de virem me pegar de novo."

terça-feira, 6 de julho de 2010

"- Eu fui até o rochedo durante a madrugada, me guiando apenas pelos dedos e pela oração. Os dedos que ainda tinha, o teu cheiro impregnado. O cheiro que o vento trazia até meu nariz que morria afogado em saudades. Morrer afogada em saudades. Rezava. Rezava e pedia perdão pelos meus pecados da carne minha com a tua. Dos nossos dedos em nós. Rezava, tateava, e ouvia o mar noturno e assustador, gritando meu nome no inferno. Quando o sol começou a nascer, eu puder ver de cima as pedras, as ondas, as espumas e o que tinha que ser feito. Rezava sem para ser perdoada, Santa Maria era mulher, deveria entender, não tinha conhecido homem, era como eu. Rezei, rezei, rezei e pulei. No inferno frio, escuro e molhado. Não morri. Mas sinto que lavei todos meus pecados. Agora estou pura novamente.
- E molhada.
- Sim.
- Está lavadinha agora?
- Sim. Estou pronta para pecar de novo.
- Se você for fazer isso toda vez, vai acabar gripada.
- Pensei que você gostasse de mulher limpa.
- Vem, deixa eu te esquentar.
- Foi por isso que fiz isso.
- Para quê?
- Para a gente ficar juntas assim."

segunda-feira, 5 de julho de 2010

PAULICÉIA CITY

-um lugar sujo-


E depois do que foi dito
ela continuava me olhando
com aqueles olhos que diziam
que sentia muito.
Que sentia muito prazer em acabar com minha vida.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

"Me sentia simples, e isso me dava uma impressão de triste. Olhava para perto, e assim, meus olhos caíam para pouco além dos sapatos. Não sentia fome, portanto minhas camisas pouco cobriam. Não haviam muito o que fazer em casa, então lia. Lia muito, e só sabia dos assuntos aprendidos em livros. Me chamavam de romântico. Minha mãe escolhia bem a genética que aparecia sem frente, e nasci bonito. Cresci sem agrados e sem espancos, diziam-me frio, quieto, ensimesmado. Todas as solas gasteis, junto com as calças, comendo poeira e chuva, mas pelo simples motivo de não querer se apertado dentro de um ônibus. Gostava de olhar para os olhos das pessoas, já que os rostos normalmente me eram vulgares, e me chamavam de profundo. Me amaram. Foi o que disseram. Não tenho provas disso. Bebi, comi, transei e voltei para casa todas as vezes, nunca expliquei o motivo porque não via motivo. Me amavam mais. Vivi incomodado, mas como era coisa minha, não comentei. Choraram e me apontaram dedos e me chamaram de frio. Mas eu só tinha aquela jaqueta. Sempre fui embora na hora errada, porque a chuva insistia em cair todas as vezes que estava sem meia."

quarta-feira, 30 de junho de 2010

"Era um tiro de distância, entre ele e eu. Um pouco distante para um afago, perto o suficiente para as palavras, próximos demais para a saudade. Os olhos são poucos, se encontram fácil. Num momento em que os gestos não diziam nada, o silêncio quebrava a rotina e o adeus era uma realidade, a distância aumentava, mas ainda no alcance de um tiro. Não há saudade que não mata, não há gatilho que não dispare, não há razão que exista em vida só. O peito com um coração a menos dói mais. Ainda há um anel a mais. Existem lembranças demais. A distância só aumenta e o tiro ainda ecoa. Até agora não sei quem morreu. Ele ou eu."

terça-feira, 29 de junho de 2010

"Me joga brutalidades na cara e os pratos na parede. Aponta os dedos para o mundo e o nariz para mim. Abre a boca, gane, xinga, cuspe e parece querer morder. Pisa leve apesar do peso da situação. É magra o suficiente para me fazer pensar em como cabe tanto ódio em tão pouco espaço. Sua pela branca, seus olhos azuis, seus cabelos entre castanhos claros e amarelos, sua roupa lilás, uma palheta de cores da loucura de sapatos e unhas vermelhas. A voz um tom acima do normal quando diz “você”, e um tom abaixo quando destila verborragicamente sua coleção vasta de palavrões. Uma ópera. É fascinante o poder de destruição que esta pequena fêmea possui. Me encanta. Me encanta sua gargantilha brilhando por causa da luz, seus olhos brilhando por causa do ódio, sua pele brilhando de suor. Ela é mais bonita assim do que nua na hora do sexo morno. Paixão. Isto é paixão. Seu furor. Me excita. Os arranhões, mordidas, os prejuízos, o falatório dos vizinhos... tudo vale a pena para ver esse momento. Compensa o esforço de inventar uma nova conta de e-mail, arranjar fotos pela net, escrever qualquer bobagem, mandar tudo para um e-mail pessoal que ela tenha a senha e eu finjo que não sei. Vale a pena esperar. Ir no mercado e deixar o computador ligado, esquecer o celular e ligar da rua e desligar quando ela atender, começar a falar de filmes, de comidas, que nunca foram assuntos nossos. Vale a pena. Sua raiva revela o que há de mais belo nela. Se um dia ela chorar, ao invés de gritar, eu vou embora."

sexta-feira, 25 de junho de 2010

"Era uma opção. Correr ou ficar sozinha. As coisas são simples. O que não é simples, não é coisa. Sua vida a tinha carregado até aquele ponto. Ela tinha sido uma turista de seus próprios dias até aquele momento em que corria ou seria incompleta. Seus estudos terminados, suas roupas já compradas, seu jantar já planejado, seu trabalho já indicado. Faculdade, roupa, comida, trabalho, são coisas. Seu celular era uma coisa. Uma coisa que brilhava, tremia, fazia barulho e chamava atenção de todos dentro da loja. Uma frase em fundo luminoso: “ou você vem ou eu vou”. Era uma opção. Correr e ir até o abraço, beijo e recomeço, ou ficar parada e deixar o passado recente ir embora. Largou a sacola e atravessou corredores, portas, calçadas, faróis e vielas, pensando na vida. A vida é uma coisa mesmo."

quinta-feira, 24 de junho de 2010

"Eu não sei se era medo ou ansiedade. Só sei que era mais que simples vontade. Sei apenas que não via um corpo dançando. Via meu homem. Apenas isso. O sol entrando pela janela, a roupa simples de ensaio, a poeira que subia do chão quando ele pisava forte, aquelas castanholas, guitarras e cajons tocando no cd, tudo o que via naquele momento que entrei na sala, tudo aquilo, era para mim. Ele era meu. Meu homem. Ele só não sabia disso. Ainda."

terça-feira, 22 de junho de 2010

"O sol nas suas costas não importava. Nem a grama sintética que era deixada para trás a cada passo. O suor que marcava a linha dos seios, axilas e a borda da gola, que escorria lentamente pela testa, que salgava um pouco os lábios, era apenas um pretexto. Tinha acabado o treino e só pensava em ir ao vestiário depois que todas as outras já tivessem ido. Por isso guardou as bolas, os cones e as cordas sozinha. Por isso que sorriu e disse que estava tudo bem ao técnico e as outras meninas. Não queria saber das outras meninas, só de uma. A boca se mantinha seca, mesmo após a água. A ansiedade fazia tremer os músculos sob a pele, mesmo com a certeza. Não havia dúvidas. Sabia que ela estaria lá, talvez já tivesse tomado banho, já estive pronta e perfumada para ir embora, mas não iria embora assim. Não. Não iria. Desceu os degraus mais rápido que o costume, virou no corredor e quase correu. Abriu a porta e não precisou procurar. Ela estava lá. Ainda suja, cansada,o cabelo um pouco mal preso. Tinha passado uma água sobre o rosto para parecer melhor. Bobagem. Não precisava disso. Não precisava de mais nada para ser linda aos seus olhos. Estava te esperando. Disse quase abaixando os olhos. Sorriram. Eu também. Estive te esperando esse tempo todo. O brilho nos olhos foi longo o suficiente para durar mais do que o primeiro beijo."

segunda-feira, 21 de junho de 2010

PAULICÉIA CITY

-um mar de solidão-


Havia o desejo próximo
e o medo de perder tudo.
Havia um sorriso velado
e a incerteza
Assim como havia rancor
nostalgia
e pequenas frustrações.
Havia o tédio
a desesperança
e uma loucura em tons de amarelo e branco
que corroia tudo
calmamente
Havia um pedido de ficar junto.
Havia uma pergunta.
O que não havia era uma resposta boa o suficiente
para nós dois.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Saramago és morto!

Me lembro exatamente quem são as pessoas que lamentei neste blog.
Me lembro como estava, como fiquei com as notícias de suas mortes.
Para cada um escrevi um textinho simples, com toda a tristeza que me percorria.
Não serei capaz de fazer isso agora - E agora José? Estamos perdendo a lucidez.

Que esteja em paz, mas meu desejo era que não descançasse nunca.

Obrigado.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Continuando sobre estréias...


EU QUERIA SER A CASSIA ELLER

A segunda peça da trilogia, finalmente exposta. Esse dia foi muito especial, porque além da estréia lancei o livro e vi o Marião!

Vamos por partes:

Peça: É a mais lésbica de todas! Digo isso, porque essa história, como ela se apresenta, só pode ser apresentada num contexto lés. Estou trabalhando com pessoas muito queridas! São 05 atrizes em cena, queria fazer com 07, dá para fazer com 03. Que comentário besta.
Rsrsrs

Se eu fosse você, eu iria!

Livro: Lancei meu primeiro livro que é justamente os textos que compõem a Trilogia Lésbica. Um bom livro.

Marião: O Marião passou na porta do teatro, falou com o Bac, e encontrei com ele sem querer. Acho que ele nem sabe que estou ali em temporada (ele tem receio das minhas peças e iria odiar o Cássia, ia gostar do Les, e não sei qual seria sua reação sobre o Conheci uma pessoa) Mas não é isso que interessa! O que interessa é que vi o Marião, de cabelo pintado e tudo. E ele está bem! Eu tive que sair correndo buscar uns lanches do coquetel que chegaram atrasados, e nem pude falar com ele. Mas ele está bem.
Quando fiquei sabendo que ele tinha levado um tiro, eu escrevi uma mensagem cheia de drama, porque eu estava chorando que nem criança... Ano passado eu fui num evento e um cara tentou levar a bolsa da garota que estava comigo e eu sem pensar dei um tapa na mão do cara (ridículo, né? Um tapa.) e o moleque levantou um revolver e atirou. Eu senti um vento e o barulho no meu ouvido, não sei se o cara errou, se era de verdade, mas em segundos eu pensei: eu podia estar morto. E o Mario tinha levado um tiro, ele podia morrer porra! Não consegui ir no hospital, porque ia fazer vexame, e não consegui assistir suas peças porque nos dias livres estavam lotadas... Não via o Mario desde o ano passado. Quando vi aquele cara enorme, me olhando torto e falando “aí Ventura”. Puta que pariu.... eu vi que estava tudo bem. Valeu ter estreado, valeu lançar o livro... O Mario está bem.


Talvez você não entenda a última frase acima... e que se importa? Talvez alguém pense que é um pensamento errado comparar uma coisa e outra. Amigos e trabalho. Um não justifica o outro. Bem... eu discordo.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Tentando voltar ao normal depois de um período na loucura... A loucura ainda não passou e o mundo está conspirando contra, mas vamos que vamos.

Gostaria de comentar – em ordem – as estréias que ocorreram, antes de voltar a escrever outra coisa.


OFÉLIA

O que você diria se eu te dissesse que ensaiamos essa peça em 5 encontros? O resto foi trabalho solitário da atriz... Se fosse outra que não Ana Cecília Reis, eu teria certas dúvidas sobre o resultado.

O espetáculo foi lindo, serviu muito bem para vermos algumas falhas que em ensaio passam desapercebidas.
Algo que me deixou no peito, foi a certeza de um bom trabalho. A atriz está consciente de tudo. De cada ação, de cada fala, onde deve estar, o porquê de cada objeto. E ela ainda fez tudo no ritmo e no tempo certos. O mínimo que se exige de uma atriz, eu sei... Mas ela fez o seu trabalho e bem.
Talvez você não saiba a importância dessa frase para mim “...fez o seu trabalho” e no quanto está inserido nela minha concepção de teatro... Mas saiba que diz muito.

O que posso dizer é que fiquei orgulhoso dessa nova montagem.


quarta-feira, 2 de junho de 2010

terça-feira, 1 de junho de 2010

Estréia!!



Hoje estreamos a segunda peça da Trilogia Lésbica!

Esse foi um dos textos mais dificeis de escrever, porque quis fugir de tudo que é fácil para mim... Aparentemente o resultado é bem bobo, mas toda a graça está na encenação.

Se eu fosse você, eu iria.

Hoje é GRATIS, e ainda tem um coquetel...

E lanço o meu primeiro livro: TRILOGIA LÉSBICA

segunda-feira, 31 de maio de 2010

A estréia foi ótima, assim que tiver fotos, coloco aqui.

Amanhã tem outra estréia.

Amanhã eu aviso.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Ofélia - Estréia


Muita correria.
Muito trabalho!

Amanhã viajo para Petrópolis - RJ, onde estreamos o espetáculo Ofélia.
É meu segundo texto que faço uma re-montagem. Estou muito feliz com o resultado!

A atriz - Ana Cecília Reis - é ótima. Esperta, dinâmica, sem frescura...
Entende teatro como eu entendo teatro.

Tenho orgulho dela.
Tenho orgulho desta peça.

Se eu fosse você, eu iria...

Pretendo falar mais quando voltar.

E quando voltar tenho mais duas estréias na mesma semana.

Com calma, tudo volta ao normal!

sexta-feira, 7 de maio de 2010

"Ele tinha uma cicatriz de queimadura que percorria do pescoço até o cotovelo esquerdo. Motivo de sobra para apanhar na escola, crescer isolado e mergulhar em livros.
Ela tinha uma cicatriz de queimadura na altura do abdômen, O suficiente para não usar biquíni, dizer não para todos os meninos de todas as festas e gostar de filmes.
Se conheceram sem querer num lançamento de um livro do lado de um cinema. Ela viu a cicatriz dele e disse oi. Ele não via a dela e fugiu como pôde.
Se esbarraram fugindo da Parada Gay. Muita alegria junta. Muitos braços, pescoços e tórax nus juntos. Ambos não bebiam mas tomaram uma cerveja. Ambos achavam que o outro gostava. Viram que erraram e contaram a verdade. Ele mostrou a dele. Ela mostrou, mas no escuro, no apartamento dele.
Ficaram juntos desde então e tiveram três filhos, dois eram gêmeos.
Quando eles completaram 4 e 5 anos, não tiveram nenhuma conversa, mas sim um olhar tranqüilo e cúmplice.
Derrubaram então água fervente enquanto as crianças dormiam.
Agora sim eram uma família."

quarta-feira, 5 de maio de 2010

"O primeiro toque é nos pêlos finos. Alguns se dobram, outros se partem.
O segundo toque é minúscula camada de queratina. Consigo repartir ao meio algumas dezenas de poros.
O terceiro toque já é na epiderme. Doeria agora se o movimento fosse mais lento.
Quarto toque: Derme. Finalmente algumas veias e artérias. Finalmente um pouco de cor.
Quinto toque é só gordura. Pouca no teu caso. Sorte no meu.
No sexto toque já é o estômago. Agora sim que isso fica divertido. É o pior lugar que existe para enfiar uma faca. Se você estiver comido, os ácidos, a meleca e tudo o mais sai para fora, infecciona, bactéria do ar entra, cria pus. Dói. Se você não tiver comido nada, só dói.
O sétimo toque não é meu. É da morte.
Eu não mato ninguém. Só faço o furo."

segunda-feira, 3 de maio de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde os corpos ocupam o mesmo espaço-


Seus seios perfeitos se movimentando graciosamente
Seus cabelos grudados no suor da testa
Seus dedos pequenos se apoiando no meu tórax
Sua musculatura contraindo fazendo nós dois gozarmos juntos.
Um momento perfeito.
Pena que não era ela
que estava ali
em cima de mim.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Liniers

Eu até entendo que algumas pessoas não gostem de Liniers.
Mentira.
Eu não entendo não.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

"Tudo bem.
Ele me apertou nos braços e me disse Tudo bem.
Ainda ecoavam os gritos atrás de nós. Ainda guardava na memória o som do meu pai arfando. E meu nome que ele repetiu quando decidiu, me pegou e saltou. Ele me segurou firme e com carinho, enquanto caíamos no abismo. Mas o que eu consegui ouvir foi ele me dizendo Tudo bem. A última coisa que ouvi antes de morrer.
Tudo bem."

terça-feira, 20 de abril de 2010

"Então uma estrela caiu do céu. E com tal força e fúria que o som repercutiu por muitos dias, o impacto provocou uma energia tamanha, que o deslocamento de ar gerou um impulso que deu 4 voltas no planeta, com duração suficiente para destruir florestas, surgir ondas imensas e derrubar montanhas inteiras. Não houve luz. Mas o poeira e fuligem erguidas se espalharam ao redor do globo, com tal intensidade que o Sol pareceu ser coberto, criando o inverno mais terrível, a noite mais longa. Parecia um castigo. A estrela derrubada devastou tudo o que havia sido criado até então. E seu nome era Lúcifer."

segunda-feira, 19 de abril de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde, bem, nada de mais na verdade-


Havia o sol lá fora.
Havia uma geladeira aqui dentro.
Havia uma tv
Haviam livros, hq’s e dois ou três cd’s.
Haviam rascunhos, arte-finais e algumas idéias geniais.
Havia um cachorro reclamando atenção.
Havia uma maçã começando a apodrecer no meu campo de visão.
Haviam pessoas que me ligavam
Joguei tudo fora.
Não havia nada que eu queria.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

"Eu juro que não queria parecer ser assim, irritado. Eu não queria fechar a cara e parecer um buldogue velho. Não queria olha para os outros de lado, ou de baixo para cima, ou qualquer ângulo que expresse escárnio, sarcasmos, tédio ou desprezo. Mesmo. Realmente não queria que minhas expressões, meus gestos e minha postura demonstrassem esses sentimentos negativos. Mas é que eu tenho um problema crônico de coceira. Por isso torço o nariz, abro a boca meio torto e cutuco a bochecha, esfrego as mãos na testa e evito que as pessoas me olhem de frente. É só por isso. Não tem nada a ver com seu gosto duvidoso para roupas, essa trilha sonora que você me obriga no escritório, nem com esse seu defeito físico que você chama de rosto. Não é nada pessoal. Sério."

quinta-feira, 15 de abril de 2010

"Primeiro eu pensava que era sonâmbulo. Acordava e via geladeira aberta, danoninho em cima da mesa, via marca de pé na parede, na tampa da privada. Não é que eu estranhei a situação, na verdade, eu olhava aquilo e sorria. Pensava que eu devia me divertir muito de noite. Curioso que isso me fazia bem até. Imaginava que mesmo com essa vida de merda que levo, meu corpo ainda sabia se divertir e exigia isso! Nem que fosse para fazer isso sozinho. Sem mim. É um pensamento engraçado, vai. Daí outro dia eu percebi uma coisa que me deixou preocupado. Algo no meu braço. Percebi no ônibus. Na verdade, eu já estava me coçando desde manhã, mas foi no ônibus que percebi que estava me coçando, deu para entender? Eu puxei a manga da camisa e vi uma camada, uma listra meio plástica, opaca, parecendo uma pele seca e dura, e fina. Como se eu estivesse descamando. Eu sabia que conhecia aquilo, mas não me lembrava. Foi então que em segundos todas as doidices que eu via de manhã, toda a bagunça que eu fazia quando durmia, me passou na cabeça de uma vez. E eu entendi tudo. Eu não era sonâmbulo. Eu tinha uma dupla personalidade. Em algum momento da noite, eu acordo como outra pessoa. E essa pessoa é um moleque. Um moleque sujo, porco e ranhento. Ranhento sim. Porque eu me lembrei o que era aquela sujeira no braço. Era catarro. Ranho. Moleque que limpa ranho no braço, que depois endurece e fica aquela merda. Merda. Agora eu tinha um maloqueiro dentro de minha casa. E eu não podia fazer nada."

quarta-feira, 14 de abril de 2010

"Rancor. Esse é o nome que se dá a essa ruga entre meus olhos, a esse dente aparecendo quando torço o lábio, a esse brilho nos olhos, a essa respiração que carrega uma palavra que você não entende.
Rancor. É a cor da minha pele, o recheio do eu estômago, o sabor da minha saliva.
Rancor. Meu substantivo. Meu adjetivo. Meu pronome.
Rancor. É o sentimento e o sentido que vai embalar teu sono.
Rancor. É minha imagem.
Rancor. A última coisa que você vai ver em vida."

terça-feira, 13 de abril de 2010

"Essa é a última noite. É a última, a última antes do fim do mundo. Essas ações serão as ultimas ações, as ultimas memórias, as ultimas tudo. O mundo vai acabar amanhã? Para mim sim. E agora, que o sol nasceu? O dia só nasce quando acordo. Então se você não dormir, o mundo não acaba? Sou ansiosa. Onde você vai, sai da janela. Já, já. Não,é sério, pára com isso, vamos conversar. Não. Não quero que a última coisa que fiz no mundo seja conversar. Gostei de ter ficado a noite com você. Se você pular, acho que meu mundo acaba. Eu já te falei isso, eu não minto. O mundo vai acabar amanhã. E eu? A última coisa que você vai ver vai ser minha bunda ao vento. Ei, isso não tem nada de romântico para você? Tchau. Adeus."

terça-feira, 6 de abril de 2010

Julia – Como assim, “nunca mais”? Não ver Romeu nunca mais... impossível. Isso é a pior sensação que existe: a de inutilidade perante o inexorável. A de sentir um nada diante do destino. Um marionete sem fios, jogado a esquerda. Um joguete. Ai, meu coração. Meu coração, porque não acredito mais em Deus. (entra Romeu pela janela) Só acredito no meu amor. Só acredito no que vejo, toco, sinto e percebo. Só tenho fé em mim. E por nós eu fico de joelhos e faço uma prece. E é só ao meu que me rendo, me entrego.
Romeu – Julia...
Julia – Shhh. Não diga nada. Este quarto é minha catedral, onde encontro com o divino. Onde meu deus, meu Amor, derrama sobre mim suas graças. Onde me avassala. Onde me entrego em sacrifício e onde meu corpo vira carne e meu sangue vira vinho. Meu corpo todo é um cálice repleto do mais puro amor. O amor-deus e nosso ato mortal. Nosso ritual. Nossa missa santa cravada em nossos corpos. Meu corpo é teu. Teu corpo é meu. E na nossa liturgia não há como separar você de mim. Vem! Vamos viver em comunhão, mesmo que para isso tenhamos que morrer aos poucos.

segunda-feira, 15 de março de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde sempre falta mais um-


Eu queria o conforto de quem abraça
e não de quem é abraçado.
Queria expressar da única maneira que conheço
Queria saber chorar às vezes.
Sempre imaginei que sentaríamos juntos e
não falaríamos sobre o que aconteceu
mas do que acontecerá.
Juntos.
Queria poder ligar e lamentar meus mortos
sabendo que não iria usar isso contra mim. Um dia.
Eu sempre quero muita coisa.
E sei que tudo que eu quero
não é metade das coisas que mereço.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Só volto semana que vem!

Para de perder tempo na vida e vá se divertir!

http://wagnerebeethoven.apostos.com/

Se você não rir, você tem problemas.

Mas tudo bem. Todo mundo tem:


http://cearensesinternacionais.wordpress.com/

sexta-feira, 5 de março de 2010

PORRA, MAURÍCIO!!!

http://porramauricio.tumblr.com/

Quer saber o porquê?

http://omelete.com.br/quad/100025557/Texto_sobre_violencia_da_Turma_da_Monica_gera_controversia.aspx

quinta-feira, 4 de março de 2010

trecho de uma peça abortada

"Kafka – Vim buscar o dramaturgo.
Vendedor de Carnes – Não temos nenhum dramaturgo.
Kafka – Então me dê um romancista, eu adapto. Sai mais barato.
Vendedor de Carnes – Não temos nenhum romancista.
Kafka – Contista?
Vendedor de Carnes – Não temos.
Kafka – Algum crítico? Pode ser algum que não vale nada.
Vendedor de Carnes – Só trabalhamos com produtos de qualidade.
Kafka – Então, um crítico de qualidade. ( Vendedor nega com a cabeça) Um autor de artigos? de crônicas? de notas?
Vendedor de Carnes – Não. não. Não.
Kafka – Então, um cínico. Me dê um cínico morto.
Vendedor de Carnes – Temos este. (mostra um corpo em putrefação)
Kafka – Mas isto aí é um espelho. Eu não quero um espelho. Quero algo que valha a pena.
Vendedor de Carnes – Isto é o comum de nossos dias. Quando aparece um espelho diante de nós, não é o queremos."

terça-feira, 2 de março de 2010

Hoje tem!

segunda-feira, 1 de março de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde sempre tem lugar para um adeus a mais-


Parado, quieto, sob a neblina
a garoa fina e fria ao fundo
a mochila sobre um ombro
as mãos no bolso
e um olhar perdido.
Ela assim que ela devia me ver.
Parada, olhos azuis
cabelos negros e curtos
uma bela idade expressa nas marcas de seu
rosto.
Eu a via assim.
Olhamos, quase sorrimos e demos um passo cada um
em direção do outro.
O que havia era a promessa de um amor.
De uma paixão fugidia.
De um encontro bandido.
O que havia era uma intensão
uma tensão oculta
O que houve foi um carro chegando, buzinando, roubando de mim o seu olhar
O que houve foi um anuncio abafado da partida do meu ônibus.
O que houve foi a certeza de que não iria ser dessa vez.
A certeza de não viveríamos o desejo.
Que não seríamos felizes de um jeito único e louco.
A certeza que isso não aconteceria
nunca mais.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

"Não fale comigo.
Não me abrace.
Não me deixe sozinha!
Não me ofereça doces.
Não deixe de me dar bombons.
Não me lembre que fui eu mesma que pedi para não me oferecer doces.
Não me dê opiniões rasas.
Não me venha com filosofias.
Não ligue a tevê.
Não reclame da demora.
Não pense que eu vou dividir a conta com você.
Não faça cara de cachorro na chuva.
Não insista em assuntos da semana passada.
Não seja estúpido.
Não diga que sou grossa.
Não pergunte se eu quero pipoca. Faça e pronto.
Não espere uma opinião sensata sobre suas roupas.
Não pergunte o que eu achei do filme sem antes me pagar um milk-shake de ovomaltine.
Não me lembre que fui eu mesma que pedi para não me oferecer doces.
Não me faça repetir tudo isso de novo!"

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

(Ela está fazendo uma atitude cotidiana, ele a admira. Entra a voz dele em OFF)

Ele – (em OFF) Eu sempre desejei você! Não, naõ fica bem. Eu sempre te quis! Nossa, parece música ruim. Hummm. Yo soy loco por ti! Hehehe. Acho que ela riria disso. Mas a intenção não é fazê-la rir, é fazê-la perceber o que eu não sou capaz de dizer. Você é a realização dos meus sonhos em forma de mulher! (algum som que demonstre desânimo) (pequena pausa) (animado) Já sei! Já sei o que vou falar! O que vou falar vai deixar bem claro meus sentimentos, não vai parecer piegas, nao vai ser brega, e ela vai entender tudo!
Ele – (ao vivo) Eusempre sonhei em transar com uma mulher como você!
Ela – (ela pára o que esta´fazendo e olha para ele) E agora?
Ele – (desconcertado) Agora? Agora eu já transei. (ela expressa alguma reação e volta ao que estava fazendo.
Ele – (em OFF) Merda.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

(Ele está quieto na dele, lendo algo, vendo tv, algo assim. Ela aparece toda agitada e feliz. Ele não a percebe, até que ela grita, anunciando um grande evento)
Ela – Festa do Buraco Quente!
Ele – Buraco Quente?
Ela – É!
Ele – Não vou.
Ela – Porquê?
Ele – Buraco quente? Coisa de gay. Não vou.
Ela –Não é nada de gay. È uma festa do pessoal do grupo, para arrecadar grana para montar a peça
Ele – Festa de grupo de teatro, e naõ tem nada de gay? (sarcástico) Tá bom.
Ela - Que pensamento mais retrógrado.
Ele – Certo. (pequena pausa) a coisa se chama Festa do Buraco quente, e não tem nada de gay? (sarcasmo) Tá bom.
Ela – Buraco quente é um tipo de lanche. Você pega o pão, tira o miolo e coloca um recheio, mas sem cortar entendeu? Você faz um buraco no pão e coloca, sei lá, carne louca, molho com salsicha, entendeu?
Ele – (nostalgico) Nossa, isso me lembrou de quando eu era criança, isso parece aquelas coisas que eu comia nas festas dos meus vizinhos quando eu era criança. (mudando de humor) Coisa de pobre. Não vou.
Ela – Como assim?
Ele – Coisa de pobre. Aquela salsicha cortada em quatro, carne desfiada. Não vou.
Ela – Mas como coisa de pobre se só para entrar tem que pagar mais de vinte pau? É normal hoje em dia fazer coisas meio bregas, meio de pobre para se divertir. É chique. É divertido. Descontrai, entende?
Ele – Hummm, acho que eu esou entendendo tudo agora; é uma festa para ir gente com grana, fingindo que gosta de coisa de pobre, porque na verdade gosta e não pode assumir, certo? Vão ficar comendo comida de pobre e pagando uma fortuna porque é divertido, ouvindo musica ruim, uma seleção do pior dos anos 80, de Sidney Magal a Beto Barbosa, porque é cool ser brega; cheia de gente descolada que não é bicha, nem sapatão, mas gosta de queimar a rosca, fazer um fio-terra e chupar um grelo porque está na moda; e vão fazer tudo isso num lugar caro com decoração estragada, ou sem decoração, porque assim é mais chique, né? E tudo isso porque é divertido, para descontrair?
Ela – É.
Ele – Não vou. (volta a sua possiçaõ original. Ela fica brava. B.O.)

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

(Ele e Ela caminham. Ela está absorta, ouvindo walkman, ou analisando os pássaros, ou simplesmente sentindo o vento. Ele discorre sem para, sobre um assunto não muito entendível)

Ele – Olha, talvez tudo seja assim mesmo, não é? Uma grande coisa atrapalhada. Uma ferida aberta, exposta, que não dói. Nem sei porque chamei de ferida, vai ver que se chamasse de coceira ia diminuir sua importância, seu impacto visual. Existe isso, né? E existe esse troço estranho, que não tem cheiro, nem sabor e não refresca. Porque olhe bem, analisando assim de perto, é estranho, fala a verdade. E de longe então? Deve ser tão confuso, deve dar impressão de tanta coisa, menos a coisa em si. E eu chamando tudo isso de coisa. Não sei o que é pior. Na verdade até sei. O pior mesmo é mais que a promessa não cumprida. O pior mesmo é a ausência não é? O não-coisa, o não-nada. O que você acha?
Ela – (trazida de volta a realidade) Hã?
Ele – (sorrindo) Eu gosto de você.
Ela – Isso é bom.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde se leva a vida, e a vida leva a lugar algum-


Ela não me arranhava
porque eu não gostava.
Era alto quando gemia
porque eu queria.
Se postava de quatro
em pé na parede
ficava em cima da mesa
só para meu ego ter certeza.
Seu gozo era bonito
seu olhar uma delícia
E seu seio era mais maduro
do que eu seria um dia.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

To Stace With Love

Na cena vemos Ele que simplesmente olha para Ela. Ela respira fundo várias vezes, de forma intensa e nervosa. Se prepara para dizer algo. E diz:
Ela – (nervosa) Então pega esse dedo, enfia no seu cu, e rasga até a testa “seu” filho da puta! (desmonta completamente o personagem) O que você achou?
Ele – Isso aí é o texte?
Ela – Claro que não. Isso é o texto. Não é genial?
Ele – Bem, ninguém vai dizer que é um texto difícil, não é mesmo?
Ela – Como assim?
Ele – Que é um texto direto. Todo mundo que ver essa cena vai entender bem o recado.
Ela – Que é?
Ele – O quê?
Ela – O recado. Da cena. Qual é?
Ele – (gagueja) É... para todo mundo... um exemplo.
Ela – De quê?
Ele – (quase nervoso) Do que se deve fazer oras.
Ela – Que seria?
Ele – (nervoso, histérico) Enfiar o dedo no cu, porra. É para todo mundo enfiar o dedo no cu!
Ela – (descrente e divertida) Não tem nada a ver.
Ele – O quê?
Ela – Não é disso que fala a cena.
Ele – Como não?
Ela – Você não estava prestando atenção.
Ele – Quem é que presta atenção em alguém enfiando o dedo no cu.
Ela – Em primeiro lugar, ninguém está enfiando o dedo no cu de ninguém, e se estivesse, faria um sucesso horrores em São Paulo. Em segundo lugar, essa cena fala de amor.
Ele – Isso não me parece uma cena de amor.
Ela – E quem te disse como tem que parecer uma cena de amor? Você acha que todo amor é bonitinho, fofinho, de mulherzinha? Amor é horrível! Amor dói! Bate, apanha, machuca, sangra e não morre
Ele – Amor não morre?
Ela – Não. Ele implode. Ele é engolido pelo mundo, pelo ego, pela vaidade, pelo desprezo. O amor não conhece a sorte de uma morte calma e tranqüila. O amor nunca morre deitado na cama, dormindo. É sempre atropelado por um tanque de guerra, ou explodido por um homem-bomba, ou eletrocutado por um raio. Ninguém fica incólume, ninguém que sobrevive, fica sem cicatrizes, quando amor some, desaparece, deixando como resíduos suas marcas na carne, na pele...
Ele – (quase apático) Ual.
Ela – E então? O que você achou?
Ele – Do quê? Da cena? Do texto? Da sua visão do amor?
Ela – Da cena.
Ele – hummm, perturbadora.
Ela – E da minha visão do amor?
Ele – hummm, perturbadora.
Ela – E de mim?
Ele – hummm, perturbada.
Ela – (cara de deboche)
Ele – Mas você os seus problemas, eu tenho os meus...
Ela – E o quê que tem?
Ele – Que aceitar é mais difícil que querer. E que isso é amor.
Ela – Ta, entendi. Mas da cena, fala da cena.
Ele – Uma bosta.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde beijar era uma brincadeira-


Começo da tarde de sol.
in Sunday
A gente ria
corria
se escondia
E torcia para que ninguém estivesse vendo.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

brincando com a sonoridade de palavras terminas em A

Canela é mais gostosa cheirada que comida

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

" - Oi. Por que você usa esse óculos?
- Porque eu não tenho um olho. Respondeu sem emoção explícita.
- Por quê?
- Porque eu caí. Respondeu sem vontade de continuar.
- Posso ver?
- Pode. Alguns segundos de silêncio até que tirou os óculos e olhou de frente.
- Posso pôr o dedo?
- Pode. E esperou. E com seu olho percebeu a mão parada no ar.
- Não vai doer?
- Em mim não. E com sua mão esquerda tento abrir espaço entre as pálpebras.
- É mole.
- Nunca me disseram. E esperou ela se cansar.
- Então, tchau.
- Posso ir com você. Não queria perder aquilo que ela trouxe para dentro dele.
- Não. Não pode. Você entende?
- Claro. Não. Não entendia."

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

"Sorrindo e calado. Calado estava. Quieto em si (maior). Seus olhos parados e pouco atentos ajudavam na composição. Sorriso curto, de poucas esperanças. E uma taça nas mãos. Pouca coisa para muita mão. Calado era desses que possuem pouca coisa, mas que as mantêm próximas. Aquela fileira curta de dentes pequenos podia parecer um convite. Quieto, Calado ficou. Mesmo quando viu dois passos semi-retos, e ouviu um convite semi-vulgar. Como era do seu feitio, sem palavras Calado deixou claro que não. O sorriso era só um acidente. Fora do contexto ela era, estava e ficou."

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

PAULICÉIA CITY

-Num riff de guitarra, num toque de bateria-


Eu conhecia aquele som.
Ou melhor
eu reconhecia aquele som.
Eu me reconhecia naquele som.
Eu me sentia inteiro e único
Naquele mar de pessoas iguais.
O riso, o suor, e o coração tranqüilo.
Parecia que enfim eu entendia o que era o Rock’n’Roll.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

"Ela tinha um abraço de pão feito em casa"

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

"Não custava nada tentar. Peguei o telefone e amaciei a voz do jeito que sempre faço. Perguntei aquelas coisas que se deve perguntar. E depois perguntei o que ela estava vestindo. Já ia responder o que sempre respondo quando perguntam o porquê, quando ela me disse que estava só de sutiã. Fiquei na dúvida se pensava nessa palavra engraçada, e um tanto nova, já que eu aprendi “soutiem” e não “sutiã”, ou se pensava no porquê que ela estaria usando apenas isto. Respondi o que sempre respondo quando preciso ganhar tempo, e ela já me disse que sua barriga não deixava usar nada. Disse que estava grávida, que estava quente, algo assim e que queria comer carne do porco; ou talvez tenha dito que estava suada como uma porca. Eu não conseguia mais pensar em nada. Eu falei qualquer coisa. Algo que nunca faço, falar qualquer coisa. Querendo ganhar tempo enquanto percebia que meu sangue sumia. Minha perna ficou bamba. Eu finalmente consegui dizer que ela devia estar linda. Mais linda que o costume. Essas coisas que sempre falo quando me respondem o que estão usando. Ela riu alto e perguntou se eu queria vê-la. Respondi que sim e desliguei o telefone. Depois de um segundo apaguei seu número da memória do celular. Um minuto depois risquei da agenda. Ainda estava com a boca seca e cheio de tesão quando entrei no chuveiro frio, sabendo que nunca mais veria uma mulher que não fosse gestante do mesmo jeito que antes. Nunca mais faria o que sempre fiz. As minhas palavras, meus gestos, meus olhares seriam eternamente falsos. Como sempre foram."

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

"Ela pousou uma rosa sobre o túmulo e qualquer um entenderia que ela gostaria de um pouco de silêncio. Entender as coisas nunca foi meu forte.

- Porque todo mês você vem aqui?

Ela me olhou de um jeito entre assustada e irritada. Incomodada seria a palavra certa. Se eu estivesse preocupado com isso.

- Todo mês você vem aqui e coloca uma rosa. As pessoas aparecem uma, duas vezes por ano. Você não. Eu não sei se tem dia certo, porque eu não estou aqui todo dia. Mas quase sempre eu te esbarro. É seu pai?

Ela confirma com a cabeça. Eu deveria me explicar melhor? Demonstrar um pouco de respeito? Porque que eu estou me perguntando isso?

- Te olhando assim. Eu percebo que talvez seu pai teria sido daquelas pessoas que odeiam flores. Ou então alérgico a rosas. E que você vem aqui só para se vingar.

Eu desisti de tentar adivinhar o que ela estava pensando. Desisti antes mesmo de começar.

- Você tem cara de que tem algo a se vingar. E pela foto, seu pai. Bem, seu pai tem cara de canalha.

Ela solta um som estranho pela boca e vai embora me empurrado. Mulher bruta.

- Ei, eu acho que você está certa.

Ela pára.

- As pessoas que nos fuderam tem que se fuder também.

Ela sai pisando duro. Má educada. Também com um pai de merda desses. Acho que vou trazer umas rosas amanhã também. Gostei dela.

- Agora são duas pessoas que irão te incomodar, velho."

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

PAULICÉIA CITY

-onde os homens se esquecem e as mulheres se cansam-


Talvez tenha sido perto do metrô
Ou talvez próximo da Paulista
Poderia ser assim, sem querer, numa rua qualquer.
Não pedi o telefone, porque era algo que eu já deveria ter.
Não me lembro o que falamos, o que marcamos...
Me lembro do peso do teus seios,
da mordiscadinha do seu dente num beijo,
do seu sorriso cantante,
de um olhar de mágoa com o mundo,
das gotas de suor sobre suas espáduas,
do cheiro doce de suas pernas.
Mas disso, quem se importa?

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

"Seus joelhos doem, mas é só pelo peso, pelo fato de sustentar seu corpo sobre eles durante tanto tempo. Esse tipo de dor não lhe incomoda. Sua fome já foi e voltou tantas vezes. Não fecha os olhos por medo de dormir. Suas axilas ardem. Sua garganta pede um pouco de consideração. Mas nada disso lhe faz sair do chão, tirar os olhos dessa mulher que está deitada, inerte. Ele reza. Ainda. Ele implora que não tenha errado na medida do clorofórmio que usou para fazer com que desmaiasse. Ele espera que não a tenha machucado muito quando a trouxe escondida para esse porão. Ele pede a Deus que o ajude a ter engravidado nessa única vez para que seu filho não nasça do pecado do desejo, porque ela não tinha condições de negar nada e ele realmente a amava. Ele anseia que dessa vez ela o entenda,e o aceite,e o ame; porque já havia enterrado seis mulheres vulgares e não havia mais espaço no quintal."

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

"Eu apenas olhava para ele, e piscava tentando acordar. Porque tudo parecia um pesadelo. Ele me falava com sua voz quase fina meio-divertida, e sorria, e me tocava com delicadeza. Me tocava como se eu fosse algo importante e frágil. De forma segura e suave, Não me parecia que eram as mesmas mãos que me bateram seis horas antes. Não parecia a mesma voz que me humilhou e machucou tanto. Não parecia o mesmo homem. Não parecia o mesmo sonho. Não estava mais naquele pesadelo, onde corri descalça, segurando uma camiseta rasgada para evitar mais vergonha. Eu tentava acordar e comecei a descobrir que não era um sonho. Ele estava mesmo sendo o mesmo que sempre foi. Gentil. Amoroso. Comecei a pensar que eu tinha sonhado os xingamentos, os tapas e os gritos. Ele falou algo como se eu não estivesse escutando realmente, e eu realmente não estava escutando. Ele piscou para mim de forma que ficou claro que ele sabia. Sabia que eu não estava escutando. Sabia o que eu estava pensando. Sabia que agora eu pensaria duas vezes antes de fazer qualquer coisa. Qualquer coisa."

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

- Porque você voltou?
- Não tinha nada para mim lá.
- Lá onde?
- Lá. Qualquer lugar.
- Não tem nada para você aqui também.
- Aqui onde?
- Aqui. Lugar nenhum.
- E o tio?
- Bom.
- E a mãe?
- Morreu.
- De quê?
- Câncer.
- Onde?
- Estômago.
- Doeu?
- Muito.
- Que bom.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Larry está dentro de uma cafeteria. Rita está passando em frente a vitrine. Se notam. Sorriem. Ela entra.

Rita – Larry! Oi. (abraços)
Larry – Passeando?
Rita – Fui no cinema. Cadê o Harry?
Larry – Não sei.
Rita – (mudando de expressão) Você não ia se encontrar com ele?
Larry – Não, eu.... (Rita muda novamente de expressão) Eu... mudei de idéia.
Rita – Mas o cliente não era seu, e o Harry ia só te dar uma força?
Larry – É verdade, mas é que...
Rita – (continuando a sua fala, se tornando aos poucos mais agressiva) “servir de escudo”? Que você na verdade não era capaz?
Larry – (tentando pensar rápido) Foi? É, mas eu desisti e deixei para ele.
(pequena pausa)
Rita – É sempre assim? Toda vez que ele fala que vai sair com você, ele sai com outra?
Larry – Não é isso, é que...
Rita – Ou foi só dessa vez? (silêncio) Há quanto tempo vocês fazem isso? (silêncio) É sempre a mesma? Ou são sempre diferentes? Ou ele fica com uma um tempo, depois ele muda para outra? (silêncio) Por quê? Por que ele faz isso? Por que você faz isso comigo? Por quê ele não consegue bolar uma desculpa diferente e deixou assim tudo tão fácil? (silêncio) Há quanto tempo você faz isso para ele?
Larry – Desde o começo.
Rita – O quê? Há cinco anos?
Larry – Não. Desde o começo.
Rita – Como assim?
Larry – Desde a faculdade.
Rita – (chocada) O quê? Ele... você... Você? Mas... Você?
Larry – (baixando primeiro os olhos, depois a cabeça)
Rita – (pequeno silêncio) Por quê?
Larry – (levantando a cabeça e firmando o olhar) Porque eu te amo. Porque eu sempre te amei. Porque eu insisti com ele para leva-lo numa festa onde havia uma garota que era afim dele. Porque eu sempre quis que ele acabasse com você, que ele terminasse o namoro, para que eu tivesse uma chance. Tentei fazer ele terminar o namoro, o noivado e o casamento. Mas ele nunca fazia isso. E quando eu vi já era tarde demais, eu estava envolvido de um jeito que não conseguia nem me afastar dele, nem me afastar de você. Porque eu nunca consegui me afastar de você. Nunca foi por acaso ter descrição de detalhes seus nas coisas que eu fazia. Nas coisas que sempre fiz. Você sabe disso. Você mesmo já reparou. E depois que reparou nunca mais disse nada.
Rita – Mas eu...
Larry – (cortando) Você sempre esteve presente em tudo o que fiz, porque tudo que eu fiz foi pensando em você. Foi querendo te ter.
Rita – (atônita)
Larry – Porque eu te amo. Porque eu sempre te amei. Porque eu te quero! (beija-a)


Duas horas depois num bar. Larry e Harry sentados bebendo em silêncio)

Harry – E então.
Larry – Ela descobriu tudo.
Harry – Como?
Larry – Ela me encontrou no meio da rua e perguntou de você.
Harry – E antes que você pudesse responder, ela já tinha descoberto tudo.
Larry – Sim.
Harry – Ela é ótima.
Larry – É.
Harry – E o que você fez?
Larry – Falei que a culpa era minha, que tinha forçado a fazer isso porque eu a amava e queria ela só para mim.
Harry – Você é um bom amigo.
Larry – Eu sei.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Minhas Listas

Ok, ok..

Esse ano foi muito fraco para livros, para teatro e para dança, esposições, circo, etc... Só foi bompara filmes porque baixei um monte de coisa.

Mas vamos ver o que sobrou de 2009:


FILMES

assiti 80 filmes

os melhores do ano: Sussurros do Coração
Tumulo dos Vagalumes
A Partida
Vick Christina Barcelona
Piaf


Animês

assisti 36 títulos

Os melhores do ano: Suzumya
Nodame Cantabile
GTO
ef~A Tale of Memories
Mushishi


Livros

Li 38 livros

O melhor do ano: Quando eu era o tal



Teatro

Assisti 21 peças

As melhores do ano: Ibéria
Othelito
A vaca de Nariz Sutil
Determinadas Pessoas



E é isso.