quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

"Ela é mais alta que eu, e parece mais forte. Mas dizem que está na mesma categoria que eu, então não me importo. Não sei o que justifica os gritos. Talvez seus peitos. Ah sim, ela tem peitos. Devem ter ar dentro, senão não tem como ela ter o mesmo que eu. Nem eu engulo essa. Isso me lembra de lamber os dentes, o céu da boca e engolir essa saliva toda. Me mantém desperta. E isso me mantém viva. Mais gritos. A platéia está vibrando. Isso porque não aconteceu nada ainda, só ela fazendo showzinho, andando em volta do ringue. Mostrando cochas e decotes. Eu não sei quanto que ela ganha para estar aqui. Eu só sei o que eu perco se perder. Eu perco se perder. Minha vida e sua constante repetição de derrotas. Saliva. Eu não posso atacar primeiro, daria vantagem para ela, tenho que esperar ela flexionar os joelhos para me acertar um soco na cara, assim ficamos na mesma altura. Talvez ela seja mais forte, mas acho que ela agüenta menos. Ops. Ela chuta. Sempre esqueço que vadia gosta de chutar. Me lembro que sempre esqueço. Minha vida e sua eterna contradição. Caralho, eu sou bonita, inteligente, não devia estar batendo em mulher para ganhar a vida. Podia ser puta, mas eu ia acabar machucando alguém. Alguém eu só machuco quem está pronto para isso. Ou pelo menos ganhando para isso. Tem gente que ganha para perder. Ganhar para perder. Ando pensando muito e apanhando idem. Vai. Dois diretos na fuça. Ela não sangra? Que vadia. Nem se altera. Parei de ouvir os gritos. Parei de pensar. Aplico aquele golpe de sumo que se consiste em apenas diversos tapas na região do plexo. Não dói. Só faz barulho. E irrita. Irrita muito. Ela é do tipo que não se irita fácil, isso é bom, porque quando acontece, não sabe o que fazer. E então comete o velho erro de tentar me segurar pelas tiras de couro do meu calção. Mas não são tiras de couro, é algo costurado sobre uma malha que escorrego, ela fica desorientada um segundo ou dois, ou menos, não importa, um piscar imóvel. Mas eu não pisco. Miro no baço e na nuca. Cotovelos não quebram, nem doem. Ela sente as pancadas e percebe que está quase perdendo. A platéia ainda não. Ela é boa em fingir. Eu sou boa em prestar atenção. Ela dá aquele meio pulinho que já tinha percebido nas vezes que chutava. Enquanto ela levanta a perna eu passo por baixo e quebro seu joelho com uma porrada só. Simples, não fácil. A platéia grita reclamando de algo. Ouço os xingos e palavrões. Com certeza ninguém apostou em mim. Estou acostumada com isso. Saio do ringue rápido porque não sou trouxa, vou para o vestiário esperar o telefonema que me prometeram. Quero ir embora daqui. De novo."

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