"Era um momento de tensão. Era
para ser um momento de calma e sossego, mas isso seria pedir demais. Havia um
raro silêncio no ar, então só poderia ser um momento de tensão. Ela estava na
cama com a mesma camiseta de ontem, que era dele. Ele estava de pé, se olhando
no espelho com a mesma cara de ontem, que também era dele. Ela gostava disso
nele, ele não tinha outras caras. Era sincero quando era romântico, era sincero
quando era bruto. Isso era bom, não havia espaços para joguinhos. Ela nunca
gostou de joguinhos, por isso gostava de homens mais velhos. Ele era mais
velho, mesmo o aniversário dela ter sido ontem, ela ainda era mais nova, e era
dele. Ela sabia, mas não falava. Ele não sabia de nada. Se soubesse, falava.
Mas estava em silêncio, olhando
para o espelho, procurando um cravo, ou descobrindo o que era aqui que coçava
dentro do nariz.
A casa estava em silêncio, e
havia uma tensão no ar.
Ela era mais nova, e por isso se
permitia se mais criança do que o esperado. Sem pensar duas vezes, jogou um
travesseiro que lhe acertou a nuca. Fez ele enfiar o dedo no nariz e bater com
a testa no espelho. Todos os sons se uniram: a batida da cabeça, o grito de
susto, e o riso escandaloso dela. Em seguida ele gritou, e chamando ela de
peste partiu para cima dela, que rindo muito, não conseguia fugir. O silêncio
foi quebrado para sempre, e o que restava da tensão era apenas a risada dela,
que ia mudando de tom, parecendo com a mesma que ela deu ontem. Aquela, que ele
tanto gostava."
SEULINDO
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